Tenho sentido o vazio dentro de mim e nem ao menos sei o que fazer. É insaciável, solitário. Na verdade queria que palavras conseguissem expressar o que tento sentir, mas elas falham e vão continuar falhando. Queria achar uma alternativa para os meus erros não parecerem, assim, heartless e para que meus acertos não sejam denominados como lucky, lucky girl. É difícil imaginar que certas trajetórias terminam e, dessa vez, fui eu quem a interrompeu. Me sinto mal, nauseada, querendo ficar presa num quarto escuro por anos tentando descobrir porque diabos essa vida dói tanto.

confusão

Adoro fazer birra, beiço, um dramalhão de filme de Hollywood, me atirar no chão e fingir que dói em lugares que nem existem no meu corpo. E, ainda assim, com tudo isso, você nem vai notar. Quer dizer, não sei se eu quero que note, mas ao mesmo tempo, quero. Entende?
Essa é a minha forma de dizer que você é meu mesmo não sendo, porque eu não te deixo sair assim... pra campo e, muito menos, entrar na jogada de outras pessoas. Você é a minha jogada, mesmo não sendo. É meu e não é. Brinco de bem-me-quer, mal-me-quer conosco todo dia, e ainda espero um meio termo, bem-mal-me-quer-bem.

Reencontros passados

(pra um amigo nem tão distante assim)

Chovia e ventava em um sábado próximo ao verão e, deitada, conseguia ouvir o barulho das cortinas se mexendo pela falta de vontade de levantar e fechar a janela. Do meu lado, entre os livros empilhados na cabeceira da cama, tinha uma carteira de cigarros escondida neles, mas cada vez que olhava lembrava minha tentativa quase falha-quase perfeita de parar e agüentava aquela vontade que surgia do dedão do pé até o meu ultimo fio de cabelo.

Don’t make me live without you, diz o personagem da tevê. “Besteira” berrei com todas as forças do meu pulmão, “não mente, idiota. Viver sem ela é a coisa mais fácil que vai fazer, ela que vai sofrer. Mentiroso.”. Com o passar do tempo, minha cama mostrou-se companheira da minha quase tristeza-quase disfarce de uma vida que, talvez, eu queria de volta. Agora não sei mais... enquanto vejo essas declarações de amor fictícios e escuto a voz de um quase amigo-quase algo a mais meu, depois de me ouvir dizer que a vida não vale a pena ser vivida

- Cala boca, eu to aqui...

- Ta mesmo?

- To.

(silêncio)

- Meu copo ta meio vazio, meio incompleto...

- Incrível te ver assim agora que eu to tri bem – falou com aquele sotaque gaúcho.

- Fico feliz. Vou desligar, au revoir.

Prefiro acreditar que aquele último suspiro que ele deu no telefone foi devido a tentativa de falar alguma coisa que poderia ser tão incompleto e vazio quanto o meu copo, mas who cares? Ele não se importava tanto assim com a imagem dos outros individualmente, mas com a idéia da imagem dos outros com ele. Acho que eu simplesmente não era o tipo de garota que ele esperava. Baixinha e morena não combina com loiro e alto. Ou poderia? O infinito tatuado no meu pulso me lembrava que tudo é possível, mas a minha rotina me lembrava de situações passadas, de pessoas antigas e de sentimentos que eu, possivelmente, nunca mais sentirei.

Ligou de novo e falou:

- Flores. Ele nunca me deu flores e eu sempre quis receber rosas, apesar desse meu jeito rústico de all star e calça jeans não demonstrar.

- Ele era um idiota, para de falar dele. Queria te ver.

(silêncio)

- Eu tava lendo em um livro de signos esses dias. Peixes tende a arruinar relacionamentos.

- Você também é de peixes, dois dias antes que eu, lembra?

- Mas eu nunca arruinei, eles foram arruinados por pessoas que não me amavam o suficiente.

(silêncio)

Lá fora a chuva tinha parado e o vento estancado, mas o frio tinha voltado. Maldito sul! Sempre tão frio, quero ir embora pro norte, pensei. Coloquei um casaco enquanto segurava o telefone com o pescoço e pedi

- hey, ta ai?

- to... to cansado.

- você acha que se nós tivéssemos tentado dois anos atrás, teria dado certo?

- não sei... mas continuamos amigos o tempo todos, isso é bom, né?

- Eu acho... mas teria sido mais interessante se você tivesse pego um cavalo branco e me seqüestrado com você.

- Um pouco antiquado... te colocaria dentro do meu carro modelo 2009 e te levaria pra minha casa, poderia ter sido assim...

- Mas não foi.

(silêncio)

- Nós nos perdemos no meio do caminho, acredito que essa seja a nossa última chance de encontrar o que jogamos fora uns anos atrás.

- E se...?

- Nós pensamos demais tempos atrás, pára. Me imagina ai, do teu lado agarrando teu rosto e falando que essa é a nossa ultima chance.

- Não sei se quero.

- Nem eu, mas e se for pra ser?

- Daí vai ser.

(silêncio)

- To ficando cansada...

- Vai dormir.

- Queria companhia, mas tenho que me agradar com o Caio.

- Quem é Caio?

- Meu ursinho.

- Porque “Caio”?

- “Mas você não vê. Não vê, não enxerga, não sente. Não sente porque não me faz sentir, não enxerga porque não quer.”

- Que? Ta louca?

- Caio Fernando Abreu. Como eu queria ter conhecido ele.

(silêncio)

Fiquei quieta por um momento, ouvindo aquela respiração que deixava meu coração pulsante, clamando pela companhia e pelo abraço daquela pessoa do outro lado da cidade, que, talvez nem soubesse o quanto esperava dele ou o quanto o queria.

Não estava mais vazia, só estava sozinha.

- Você ta bocejando, vai dormir.

- Não. To bem.

- vou desligar e te deixar.

Deve haver algum tipo de sentido, algum tipo de loucura. Porém, cansei de escrever textos e pensar em pessoas que um dia foram meu mundo e que, escrevendo, poderia senti-los comigo. Encontrei na estranheza um motivo pra continuar, mesmo que pense que daqui um tempo, ele se enquadrará no conceito “você foi tudo e eu perdi.”.

ontem éramos três...

Apareceu num sonho, alguma noite dessas. Ela o amava. Ele a amava também. Mas levavam essa coisa louca, o amor, como fácil e simples demais. Ela gostava de estar com ele, ele gostava de estar com ela. Isso era tudo.
Estavam juntos no sonho, ele segurava sua mão e a beijava, como se fosse algum doce. Sentados, lado a lado, ela não enxergava nada além daqueles olhos penetrantes, aqueles cabelos, aquela face, enfim, tudo que fazia parte daquele corpo a agradavam. Na verdade, as coisas tinham ficado mais bonitas desde o dia que os seus olhos o viram.
Em todos os dias que se seguiram, o sonho se repetia e era só isso que aparentava: estavam juntos e apaixonados.

A porta do quarto abria lentamente na manhã seguinte, olhou no relógio, era quase uma hora da tarde, e ele não teria nem levantado o telefone para ligar. Bom, então o que iria fazer? Deitou no sofá, ligou a TV, folhou algumas páginas do jornal. Despistou um amigo, uma festa e até uma janta. Queria se render a angústia de lembrar daqueles dias que rezava para que fossem soterrados na sua memória.
Nem ela mesmo entendia, só tinha certeza de uma coisa: se soubesse o quão importante ele seria, nunca teria o deixado entrar na sua vida. Sabe, não gostava daquela incerteza, daquela tristeza. Sempre foi melhor sozinha e é assim que deveria ser, mas, meu Deus, como seria bom ter alguém para compartilhar isso.
No meio de tantas e tantas ilusões, rendia-se em limpar as próprias lágrimas, que, quando encostavam nos seu lábios, tinham um gosto salgado, tentava as limpar enquanto as pontas das suas unhas mau cuidadas arranhavam o que sobrou do seu rosto.
Ela esperava que durante essa madrugada de agosto, ele despertasse e percebesse que ninguém nunca o amou como ela amava. Porra, que loucura colocar tudo no passado! Nem que alguém conseguisse o amar com toda força de qualquer existência, seria capaz de o amar em milhões de anos como ela em um dia.
Porém, só acha conforto em meados de seus sonhos quando consegue dizer com convicção que o ama, repetindo sozinha, imaginando que aquele ouvido realmente seja o dele. Era uma forma de vitória ter ainda como dizer isso. Mas tão triste que parece uma derrota.

"Ontem éramos três: eu, você e a felicidade;
hoje somos dois:
eu e a saudade"
E passaram-se uma, duas, três horas. E nada de você. Me ligou para falar que estava doente e não poderia sair de casa, o único problema nisso é que sua voz soava normal para os meus ouvidos, meio surdos, meio desgastados.

Eu tento entender, juro que tento. Mas minhas pernas perdem suas forças e minha mente gira formando círculos irregulares na minha frente. Meus olhos, agora perdidos, tentam encontrar algum motivo para continuar, parar de chorar, deixar de sofrer. O problema é que não conseguem, não dá. Talvez meus sentidos estejam um pouco afetados de tanto vinho ou cegos por tanto amor.

E passaram-se uma, duas, três horas. E nada mais de mim.

na escuridão de uma noite

"A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar

duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre."

- Exatamente assim - disse enquanto caminhava pela casa com as pernas trêmulas - Exatamente como esse verso.

O frio de julho tirava a beleza do corpo dele coberto por trapos velhos com um perfume agradável. Foi assim, um de costas para o outro naquela escuridão dentro de casa com o teto coberto pela umidade do inverno, que disse:

- Consegue perceber a semelhança? É de tamanha agonia, de tanta tristeza... - não consegui continuar. Sentei-me, desequilibrei minhas pernas inquietas e bati na garrafa de champagne que estava no chão. Ele recuou, tocou nas minhas mãos e depois saiu andando em direção a janela embaçada. Respirou fundo e me deixou continuar:

- Depois, no final, ela mostra como tudo é sem jeito, sem nexo algum. Quero dizer, nós acabaríamos sofrendo de qualquer jeito. Como se fosse um estômago contraído, uma sensação de abandono.

Saiu de frente ao frio, começou a mexer a sua coluna de uma forma estranha, dobrou o punho: parecia que estava pronto para brigar, levar um soco aonde havia as contrações no estômago. Acendi um cigarro, conseguia ver somente aquele vermelho no escuro. Continuei:

- Você sabe que de alguma maneira o sentimento sempre esteve ali, bem próximo a você. Poderia tê-lo tocado, tê-lo apanhado no ar. Ai volta os nós no estômago. Sem entender, você pára e pergunta: mas de quem foi o erro?

Ele fez um movimento de como se precisasse falar, mas o detive.

- Já sei. Agora é a hora que você diz "Que merda! Pára de ser tão pessimista. Tá tudo tão bem e você tá achando defeitos em tudo". Bom, mas a verdade é que não sei se a palavra é exatamente essa: erro. É tão forte, tão banal. Mas as coisas sempre estiveram no mesmo lugar, paradas. Era tudo tão imediato, tão agora, tão necessário e ao mesmo tempo não era. Você não entendia essa minha mania de precisar de você e fui me acostumando com a solidão, com a ausência. Até que, se um dia, você realmente for embora não vai doer tanto. Porém, foi você quem não soube fazer o movimento correto, o movimento perfeito, invejável. Eu precisava ser salva por alguém exatamente como você.

Cada movimento que dava em direção à ele era tão restrito que me sentia abolida, o tempo tinha parado. Não havia tempo. Era uma eternidade em forma de escuridão. Para conseguir sonhar e ter os dedos dele encaixando nos seus, era preciso submeter-se a um mundo de ilusões.

- O erro? Pois é, o erro. Às vezes penso se o erro não veio de dentro, algo psicologicamente incumbido em nós, mas de fora? Se o erro não foi seu, mas foi de tudo? Se fui eu quem não soube estar pronta e não sabia captar as horas quando estava ao seu lado. Eu insistia na perfeição, nas coisas preparadas para acontecer, e, num piscar de olhos, nada acontece. Entendeu?

Estendi minha mão no ar a procura da dele, o que me consolou é que ele tinha retornado àquela antiga mania de beijar minha palma quando estava muito longe dos meus lábios. Com certa melancolia por detrás de nossas vozes roucas, talvez pelo cigarro, nossos corpos se encontraram. Você me abraçou. Mas limitou-se em somente me segurar. Seu corpo me machucava da mesma forma que o mundo machuca Deus.

- Me solte agora - falei - e olhe para os meus olhos. Você consegue perceber? Eles estão perdidos. Completamente perdidos. E não há nada que eu possa fazer.

alguns dias atrás

Eu estava tentando te descrever a alguém uns dias atrás. Nenhum rapaz que eu conheço é parecido com você.
Eu não consegui nem ao menos falar: "Ah, sabe aquela banda? Pois é, ele parece o vocalista, mas o cabelo dele é cacheado e o sorriso é muito mais cativante do que o de qualquer pessoa que você possa conhecer." Eu não consegui dizer isso porque você não se parece com ninguém que eu já tenha visto.
Eu acabei descrevendo você como uma história que o meu pai me contou quando eu tinha cinco anos ou seis. Uma sobre um filme antigo que relatava como uma família de fazendeiros vivia no campo sem nenhuma eletricidade. Eles tinham que usar lanternas para enxergar a noite e não possuíam nenhum aparelho elétrico, nem ao rádio conseguiam escutar.
Então, o governo decidiu construir postes e geradores de luz na frente da fazenda e eles olhavam para toda aquela modernidade assustados. O medo havia acabado: a escuridão foi embora.
No início foi difícil de conviver com aquelas luzes brilhantes que ofuscavam os olhos e clareavam a noite, porém depois perceberam a dimensão e a importância daquela clareza que não iria embora.
Eles queriam eletricidade para ir a qualquer lugar do mundo e para conseguir ouvir ao presidente naqueles dias difíceis. Eles queriam a luz para guiá-los entre o imenso vazio do escuro.
É assim que eu te descrevi, minha luz.