na escuridão de uma noite

"A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar

duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre."

- Exatamente assim - disse enquanto caminhava pela casa com as pernas trêmulas - Exatamente como esse verso.

O frio de julho tirava a beleza do corpo dele coberto por trapos velhos com um perfume agradável. Foi assim, um de costas para o outro naquela escuridão dentro de casa com o teto coberto pela umidade do inverno, que disse:

- Consegue perceber a semelhança? É de tamanha agonia, de tanta tristeza... - não consegui continuar. Sentei-me, desequilibrei minhas pernas inquietas e bati na garrafa de champagne que estava no chão. Ele recuou, tocou nas minhas mãos e depois saiu andando em direção a janela embaçada. Respirou fundo e me deixou continuar:

- Depois, no final, ela mostra como tudo é sem jeito, sem nexo algum. Quero dizer, nós acabaríamos sofrendo de qualquer jeito. Como se fosse um estômago contraído, uma sensação de abandono.

Saiu de frente ao frio, começou a mexer a sua coluna de uma forma estranha, dobrou o punho: parecia que estava pronto para brigar, levar um soco aonde havia as contrações no estômago. Acendi um cigarro, conseguia ver somente aquele vermelho no escuro. Continuei:

- Você sabe que de alguma maneira o sentimento sempre esteve ali, bem próximo a você. Poderia tê-lo tocado, tê-lo apanhado no ar. Ai volta os nós no estômago. Sem entender, você pára e pergunta: mas de quem foi o erro?

Ele fez um movimento de como se precisasse falar, mas o detive.

- Já sei. Agora é a hora que você diz "Que merda! Pára de ser tão pessimista. Tá tudo tão bem e você tá achando defeitos em tudo". Bom, mas a verdade é que não sei se a palavra é exatamente essa: erro. É tão forte, tão banal. Mas as coisas sempre estiveram no mesmo lugar, paradas. Era tudo tão imediato, tão agora, tão necessário e ao mesmo tempo não era. Você não entendia essa minha mania de precisar de você e fui me acostumando com a solidão, com a ausência. Até que, se um dia, você realmente for embora não vai doer tanto. Porém, foi você quem não soube fazer o movimento correto, o movimento perfeito, invejável. Eu precisava ser salva por alguém exatamente como você.

Cada movimento que dava em direção à ele era tão restrito que me sentia abolida, o tempo tinha parado. Não havia tempo. Era uma eternidade em forma de escuridão. Para conseguir sonhar e ter os dedos dele encaixando nos seus, era preciso submeter-se a um mundo de ilusões.

- O erro? Pois é, o erro. Às vezes penso se o erro não veio de dentro, algo psicologicamente incumbido em nós, mas de fora? Se o erro não foi seu, mas foi de tudo? Se fui eu quem não soube estar pronta e não sabia captar as horas quando estava ao seu lado. Eu insistia na perfeição, nas coisas preparadas para acontecer, e, num piscar de olhos, nada acontece. Entendeu?

Estendi minha mão no ar a procura da dele, o que me consolou é que ele tinha retornado àquela antiga mania de beijar minha palma quando estava muito longe dos meus lábios. Com certa melancolia por detrás de nossas vozes roucas, talvez pelo cigarro, nossos corpos se encontraram. Você me abraçou. Mas limitou-se em somente me segurar. Seu corpo me machucava da mesma forma que o mundo machuca Deus.

- Me solte agora - falei - e olhe para os meus olhos. Você consegue perceber? Eles estão perdidos. Completamente perdidos. E não há nada que eu possa fazer.

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