Lítio


Sempre fui uma variável. Nunca consegui manter um relacionamento e muito menos uma amizade, sempre achava que tinha algo de errado com as pessoas ao meu redor. Eu nunca estava errada, poderia ter cometido o pior pecado, mas a culpa não era minha. Sentia-me no topo do mundo, inabalável.
Não me importava em quantos relacionamentos errados tinha ou em quantos amigos perdi. Eles não eram e nunca foram melhores que eu. Era invencível e nem ao menos o céu estava a minha altura. Tinha certeza absoluta que minha vida dependia somente do quanto superior eu era. Acredite, eu era a Deusa em terra.
Em compensação, me irritava com tanta facilidade que qualquer palavra em vão me faria ter um impulso louco de pular no seu pescoço com uma faca e desejar que você morresse. Nunca desconfiei de nada. Afinal de contas, nem deveria.
Teve um dia, no meio a essa minha certeza de superioridade, que eu estava parada no meio de um pátio. Simplesmente parada, estática mesmo. Minha amiga veio e me perguntou 'Flávia, o que aconteceu?'. Nada, nada... eu não sabia também. Meus olhos estavam fixos nos pés das pessoas que continuavam a correr para a rua, uma parte de mim dizia, e, até gritava porque eu ainda estava lá. Não sabia... não sabia.
A dor tomou conta de mim. Sonhos jogados foras, ideias desperdiçadas e dias perdidos passavam na minha memória e não tinha nada que eu pudesse fazer. Meu ex namorado não iria voltar e muito menos entender que, naquele momento, eu gostava dele. Minha melhor amiga, que já tinha ido embora, não ia compreender porque eu chorava tanto. Meus companheiros de aula achavam que era pura invenção para chamar atenção. Eu estava bem no dia anterior.
Parei de comer, parei de escrever e de perder meu tempo achando que eu era melhor que tudo e todos. Passado um mês, fui ao médico e ele me diagnosticou como depressiva, mas não era isso. Ele estava errado.
Como que eu poderia estar tão feliz um mês atrás e, simplesmente, cair? Não me conhecia mais e me desconheci mais ainda quando comecei a tomar aquele antidepressivo. Eu estava sozinha e as pessoas ao meu redor progrediam enquanto estava parada.
Meu Deus, o que há de errado comigo?
De alguma forma, queria continuar apaixonada pela minha tristeza mas queria minha liberdade de volta. Fui novamente ao médico e dessa vez eu disse
-Doutor, não me sinto bem. Não adianta. Hoje posso estar triste, daqui a um mês posso estar muito feliz...
Agora ele me receitou um remédio que contém lítio. E, por enquanto, está tudo bem.
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wonder what's wrong with me...

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